Galáxias

Essa é a galáxia mais solitária do universo

Já sabemos que as distâncias astronômicas são incrivelmente implacáveis e, qualquer simples ano-luz já equivale a vários trilhões de quilômetros através do espaço. Porém, por mais que estejam distantes e fora do nosso alcance, a Via Láctea tem várias galáxias próximas que nos seguem durante toda nossa jornada pelo o universo. Essa população de galáxias é bem considerável e é fácil de localizá-las em várias posições do céu, mas imagine se fosse o contrário e não existisse nenhuma galáxia nas proximidades? Pois é, esse é o caso de uma curiosa galáxia descoberta do telescópio Hubble.

Não precisamos sequer de grandes telescópios para descobrir galáxias próximas à nossa, pois em uma noite bem escura e estrelada já conseguimos diferenciar galáxias distantes até mesmo a olho nu. É o caso da Grande e Pequena Nuvem de Magalhães, duas pequenas galáxias que orbitam a Via Láctea a cerca de 200 mil anos-luz de distância. Existem outros exemplos observáveis de galáxias maiores, como é o caso de Andrômeda e sua localização a 2 milhões de anos-luz de distância. A verdade é que nunca foi um problema observar esses objetos mais distantes aqui da Terra e, não é atoa que Andrômeda já tinha observada nos anos 1500. Se as nossas redondezas fossem como algumas galáxias mais distantes, esse tipo descoberta teria sido impossível naquela época e, talvez, as galáxias não teriam sido descobertas a menos de 100 anos atrás com o surgimento de equipamentos astronômicos mais sensíveis e sofisticados.

Créditos: HUBBLE/ESA/NASA

Na realidade, a galáxia da Via Láctea é rodeada por imenso aglomerado de galáxias conhecido como Grupo Local, que faz parte de uma rede cósmica maior ligada pela gravidade de milhões de galáxias através do superaglomerado de Laniakea. Somente no grupo local da Via Láctea, temos uma população de galáxias bem grande num raio de 10 milhões de anos-luz, onde esse número pode atingir pelo menos 30 grandes galáxias espalhadas por essa região em todas as direções, mas em escalas ainda maiores, o superaglomerado pode conter 100 mil galáxias espalhadas por 520 milhões de anos-luz em relação a Via Láctea. Definitivamente, a nossa região do universo não está longe de ser vazia. Na contramão dos superaglomerados que formam a estrutura geral de massa visível do universo, existem também os misteriosos supervazios, regiões onde a população de galáxias cai absurdamente e não encontramos nenhum sinal de luz por vários milhões de anos-luz de extensão.

Bom, mas o fato é que essas regiões são marcadas pela baixa presença de matéria visível na forma de estrelas e galáxias e, um deles, conhecido como Vazio de Boötes, é o maior já descoberto em meio a vastidão do espaço. Localizado a cerca de 700 milhões de anos-luz da Terra, essa região assustadora é o mais próximo de um vácuo perfeito que podemos encontrar dentro do universo observável, pois partículas avulsas de matéria existem até mesmo no meio intergaláctico. O local recebe o nome de Boötes pois foi descoberto na direção da constelação que leva o mesmo nome. Se você estivesse localizado no centro desse vazio, o universo pareceria um local muito escuro com as galáxias ainda mais distantes, pois se estende em 350 milhões de anos-luz de diâmetro e isso é tão, mas tão gigante que é equivalente à distância de Andrômeda hoje multiplicada por cerca de 140 vezes. Dessa forma, um possível planeta localizado por lá teria o céu noturno mais escuro de todos, sem quaisquer objetos fora de sua galáxia de origem para observar e, o universo, seria resumido unicamente a essa galáxia local.

Mas dentro desse vazio, a população de galáxias não chega a ser inexistente e hoje sabemos que dentro desses 350 milhões de anos-luz, 60 galáxias solitárias existem por ali. Observe só a diferença absurdamente grande. Aqui em região, neste espaço, podemos encontrar pelo menos pouco mais da metade de 100 mil galáxias, já no Vazio de Boötes a densidade chega a apenas 60 galáxias. É ou não é impressionante? Dentro desse vazio, o Hubble encontrou a galáxia de identificação MCG+01-02-015. Ela foi considerada pelos astrônomos como a galáxia mais solitária do universo devido a sua localização dentro do Vazio de Boötes. A maioria da galáxias do universo conectadas entre si pela gravidade as unindo nos aglomerados que já citamos aqui no vídeo, mas para MCG o cenário é total diferente, pois não tem ligação com qualquer superaglomerado e não encontra nenhuma galáxia próxima a uma distância de pelo menos 250 milhões de anos-luz em todas as direções. Pois é, enquanto podemos numerar várias galáxias próximas da Via Láctea em menos 10 milhões de anos-luz, MCG não tem qualquer companheira próxima e ela só encontra pontos de luz incrivelmente longínquos.

Essa galáxia está tão isolada que, se a Via Láctea estivesse situada no mesmo lugar, os humanos saberiam da existência de outras galáxias até o desenvolvimento de telescópios mais sofisticos na década de 1960, em contrapartida à observação de Andrômeda vários séculos atrás.

O surgimento de MCG+01-02-015 é realmente peculiar, mas algumas hipóteses tentam dar uma luz de como ela foi parar por ali. Primeiro, talvez ela tenha nascido ali mesmo por eventual colapso de uma nuvem de gás, mas também pode ter se formado longe dali, mas alguma interferência gravitacional a lançou para dentro do Vazio de Boötes. A verdade é que é difícil imaginar o quão isolada está a MCG em comparação com a Via Láctea. Qualquer alienígena hipotético vivendo nessa galáxia em meio ao vazio, sem telescópios avançados ou sem conhecimento avançado de astronomia, o universo pareceria um lugar muito diferente do que estamos acostumados por aqui. Eles teriam céus mais escuros de todo o universo, exceto quando iluminados pelas estrelas em sua própria galáxia.

Quando você estiver olhando o céu e admirando a imensidão, lembre da MCG. Se nós, aqui rodeados de galáxias nos sentimos pequenos, imagina só viver por lá, onde não existe qualquer galáxia próxima para se sentir conectado de alguma forma com a vizinhança do espaço. A verdade é que o universo às vezes pode ser bem assustador.

Alexsandro Mota

Nordestino, um grande amante da astronomia e divulgador científico há quase uma década. Sou o criador do projeto Mistérios do Espaço e dedico meu tempo a tornar a astronomia mais acessível.