O sistema de luas do planeta Júpiter é fantástico. Até o momento, o gigante gasoso possui cerca de 80 satélites naturais descobertos e cada um possui suas peculiaridades próprias. Entre dezenas de pequenos mundos, Io chama atenção de longe por conta de sua superfície altamente enrugada e colorida. Essa é, de longe, uma das luas mais icônicas do sistema solar, principalmente porque estamos falando de um dos mundos mais ativos quando o assunto é atividade geológica. Durante as passagens da sonda Juno, ela usou um dos instrumentos científicos para ver Io em infravermelho e descobriu algo interessante: essa lua está repleta de pontos brilhantes na superfície.
Um planeta como Júpiter possui um sistema de luas próprio que até parece um sistema planetário ao redor de uma estrela. A variedade de pequenos mundos por ali é impressionante e temos desde luas que podem conter água líquida abaixo da superfície, outros com aparências bem estranhas e aqueles com o interior incrivelmente ativo, como é o caso de Io. Essa não é uma das maiores luas do sistema solar, pois Io é só um pouco maior que a lua terrestre e seu diâmetro equatorial está na casa de 3.600 quilômetros. Apesar de não ter uma atmosfera considerável ao ponto de formar um clima, as sondas que já visitaram Júpiter detectaram uma fina camada de enxofre que cerca o satélite natural, criando um finíssimo invólucro desse elemento, mas mesmo assim não cria um ambiente semelhante à Titã, por exemplo, que é a única lua no sistema solar a conter uma atmosfera realmente substancial.

Isso faz com que a superfície Io tenha temperaturas muito extremas, pois sempre está diretamente em contato com o espaço e, por lá, temos temperaturas gélidas de -130 graus celsius. Porém, isso é só um fato superficial da lua, pois o lado realmente interessante do satélite natural está logo abaixo da sua superfície colorida e, ali, temos um dos locais mais extremos e interessantes de todo o sistema solar. Olhe só a superfície dessa lua, parece ou não uma pizza que passou dias fora da geladeira? Pois é, são muitas cores contrastando com um ambiente amarelado. Devido ao efeito de sua gravidade fraca, Io não consegue manter uma atmosfera, mas a verdade é que muito material é ejetado o tempo todo para fora do interior do satélite natural.
Pois é, essa dinâmica incrível chamou a atenção dos astrônomos e eles usaram uma das sondas mais tecnológicas que já visitou Júpiter para observar Io e, bom, as imagens que os instrumentos da sonda Juno fizeram foram impressionantes. Usando o instrumento JIRAM, um sigla em inglês que significa Mapeador Auroral Infravermelho Joviano, a sonda Juno registrou a visão que podemos ver abaixo do satélite natural. Sim, estamos vendo vários pontos brilhantes que cobrem vários pontos de Io, fazendo a lua brilhar enquanto orbita o planeta Júpiter. Basicamente, a imagem mostra a lua semi-iluminada com pontos brilhantes vistos logo além do limite dia e noite onde a luz do sol consegue atingir, ou seja, isso quer dizer que tais pontos brilhantes não possuem influência alguma da incidência da luz solar e as marcas brilham unicamente por elas mesmas. De qualquer forma, o que estamos vendo é visão raríssima dos vulcões de Io emitindo calor para o espaço e cada ponto brilhante representa uma cadeia ativa dos compostos que formam a crosta de Io sendo derretidos.

Até o momento, já contabilizamos cerca de 400 vulcões ativos na superfície de Io. O grande segredo por trás de um lugar assim está basicamente nas características orbitais de Io ao redor de Júpiter. O objeto em si orbita Júpiter a cerca de 420 mil quilômetros de distância, basicamente uma distância parecida com aquela que a Lua orbita a Terra, mas quando você considera o tamanho de Júpiter, os 420 mil quilômetros que separam os dois astros se torna uma distância muito irrelevante e a influência gravitacional do gigante gasoso causa um efeito de maré tão forte, tão forte que desloca a crosta de Io em até 100 metros em direção a Júpiter, criando uma das maiores protuberâncias gravitacionais do sistema solar.
Em outras palavras, Júpiter puxa tanto Io em sua direção que imagine que a crosta da lua se eleva 100 metros em direção ao espaço devido a esse efeito gravitacional. Júpiter é um gigante e com certeza ele causaria algo assim em qualquer corpo celeste que ousasse orbitar próximo demais a ele. Então, levando em conta o período orbital de pouco mais de 1 dia de Io ao redor do gigante gasoso, diferentes áreas do satélite natural costumam ficar contraindo e descontraindo, criando muito atrito nas camadas internas e gerando energia suficiente para derreter as rochas que compõem esse corpo celeste. Por incrível que pareça, o instrumento JIRAM não foi feito para estudar Io, mas sim para observar o sistema de auroras de Júpiter, mas como os sensores possuem alta sensibilidade no infravermelho, ele pode ser usado para mapear esses pontos quentes na superfície. As estimativas hoje indicam que existe um oceano de magma cerca de 50 quilômetros abaixo da superfície e os efeitos de maré proporcionam um aquecimento que pode atingir até 1200 graus celsius bem lá embaixo.
Io não é só uma lua incrível, mas também é aquele lugar onde processos físicos intensos podem dizer muito sobre a dinâmica entre os corpos celestes. A superfície icônica é só um detalhe, mas o verdadeiro show de ciência está acontecendo bem abaixo dessa crosta e pode nos dizer muito sobre a geologia interplanetária.
Nordestino arretado, um grande amante da astronomia e divulgador científico há quase uma década. Sou o criador do projeto Mistérios do Espaço e dedico meu tempo a tornar a astronomia mais acessível.